Público - 29 Dez 06

 

União Europeia preocupada com violência em videojogos

João Pedro Pereira

 

O comissário europeu para a Justiça, Liberdade e Segurança, o italiano Franco Frattini, vai reunir-se, no início de 2007, com representantes da indústria de videojogos e especialistas em saúde e psicologia infantil. Em cima da mesa estará um tema polémico: a violência nos jogos de computador e os efeitos destes sobre crianças e jovens. O encontro, que visa estabelecer novas regras de regulação no sector, terá lugar depois de os Estados-membros debaterem o assunto, numa reunião de ministros agendada para Janeiro, na Alemanha.
A intenção de tomar novas medidas para proteger os menores da violência em jogos de computador foi anunciada este mês por Fratinni, no Parlamento Europeu. Desde Novembro que o comissário tem mostrado grande preocupação com o assunto, após ter visto algumas cenas do jogo para PlayStation Rule of Rose. Neste, a personagem controlada pelo jogador é uma jovem orfã, sujeita a rituais de integração por parte das outras raparigas do orfanato. Frattini disse à imprensa estar "profundamente chocado" com o que disse serem cenas de "uma crueldade e violência obscenas".
Responsáveis pelo jogo garantiram que o comissário europeu exagerada, num protesto secundado pelos reguladores do sector em Inglaterra, país onde a questão atraiu grande atenção dos media.
Rules of Rose foi já lançado nos EUA e Japão, mas a distribuidora responsável pelo território europeu decidiu, na sequência da polémica, cancelar o lançamento do título (que estava marcado para 24 de Novembro) em quase todos os países. Rule of Rose chegou apenas a França e Itália, o que levou o presidente da câmara de Roma a pedir que fosse retirado do mercado.
Franco Frattini critica ainda o facto de, em muitos países, menores poderem comprar jogos para adultos e mostrou-se descontente com o actual método de classificação de videojogos.
Na Europa, a classificação depende da adesão voluntária dos fabricantes a um sistema adoptado em vários países e regulado por um corpo independente e apoiado pela Comissão Europeia, mas sem qualquer efeito legal.
O sistema - denominado Informação Pan-europeia sobre Jogos (PEGI, na sigla inglesa) - traduz-se numa série de ícones que indicam as faixas etárias para que um título é apropriado (Rules of Rose foi classificado para maiores de 16 anos) e que alertam para a eventual existência de cenas de violência, sexo, uso de drogas, linguagem inapropriada, discriminação de grupos sociais ou de cenas que possam ser consideradas assustadoras para crianças. As classificações são atribuídas pelo PEGI depois dos fabricantes auto-avaliarem o seu produto e responderem a uma série de perguntas padrão.
O comissário para a Justiça pretende leis mais rígidas, que restrinjam a venda de alguns jogos a menores, e diz ponderar a criação de legislação para a classificação de jogos, caso um eventual código de conduta saído das reuniões com os representantes da indústria seja considerado insatisfatório.

Jogar reduz autocontrolo
A comunidade científica permanece em dúvida sobre e relação entre a violência no écrã e acções no mundo real, porque vários estudos não estabeleceram essa ligação.
Mas algumas investigações recentes apontam para que este entretenimento possa produzir níveis elevados de excitação, menos autocontrolo e uma maior tolerância quanto a cenas reais de violência.
Um trabalho levado a cabo este ano na Universidade de Iowa, nos EUA, demonstrou pela primeira vez que alguns videojogos fazem com que os jogadores tenham uma menor sensibilidade a situações violentas.
Os investigadores usaram um grupo de 257 estudantes universitários (124 homens e 133 mulheres). Cada um jogou durante 20 minutos um jogo, sorteado de um conjunto que incluía quatro jogos violentos (entre os quais Mortal Kombat e Carmageddon, ver coluna ao lado) e quatro não violentos (como jogos de Tetris ou Pinball). De seguida, os participantes foram expostos a imagens de vídeo com cenas de violência diversas. Através da medição do ritmo cardíaco e da reacções cutâneas, os cientistas concluíram que os estudantes que tinham experimentado os jogos violentos se tornaram mais insensíveis e tolerantes face às imagens em vídeo.
Outro estudo, também realizado nos EUA, veio em Novembro alertar para o facto de a exposição a videojogos violentos estimular, a curto prazo, zonas do cérebro responsáveis pela excitação, ao mesmo tempo que diminui a actividade de zonas responsáveis pelo auto-controlo.